CHANSON D'AUTOMNE

Les sanglots longs
Des violons
De l'automne
Blessent mon coeur
D'une langueur
Monotone.

Tout suffocant
Et blême, quand
Sonne l'heure,
Je me souviens
Des jours anciens
Et je pleure.

Et je m'en vais
Au vent mauvais
Qui m'emporte

Deçà, delà,
Pareil à la
Feuille morte.

Paul Verlaine
CASTELOS DE VENTO: Em demanda do phallus perdido

sexta-feira

Em demanda do phallus perdido


Em demanda do phallus perdido

Sobre o vale do Nilo cai triste a madrugada.
Na feral câmara a incenso perfumada,
conservado em bálsamos em esquife de ouro,
jaz morto Osíris, o rei-deus do Além e da fertilidade,
esquartejado por seu irmão Seth, deus dos infernos e da escuridade.

Sobre o corpo do amado esposo debruçada,
Ísis, a excelsa rainha-deusa, beija-lhe o rosto e chora em silêncio.
Oh, quão profundo é o amargor que lhe lavra a alma!
Observam-na, de ar grave, escribas e guerreiros,
enquanto os sacerdotes entoam laudes por entre vapores e cheiros
de incenso que pesam na humidade sombria da mastaba.

Lá fora, à sombra dos sicómoros e palmeiras,
fustigado pelo vento agreste e quente do deserto,
o povo anónimo reza e carpe e não entende
por que razão a vida dos deuses também se acaba.

Súplice e harmoniosa, ouve-se a voz de Ísis:

«Ditoso Geb, meu Pai! Recolhi ao longo do Nilo, como ordenastes, (1)
a cabeça, o tronco, e à excepção de um, todos os membros (2)
de meu amado esposo, e erigi nas margens de cada local celsos templos.

Vós que sois da Terra o grande deus,
dai vida ao vosso filho, meu extremoso marido e gémeo irmão,
que jaz inerte e frio nesta câmara mortuária.
E vós, Nut, Mãe amada, deusa dos Céus,
que sois da Noite luminária,
fazei com que o virtuoso falo que com as argilas do Nilo moldei
devolva a meu amado esposo a virilidade originária.»

«Nobre Filha minha! Quando no primeiro dia de Thoth a noite for a meio, (3)
transformada em águia, conhecerás de novo Osíris, que íntegro ressuscitará. (4)
E um deus nascerá desse maravilhoso enleio.
Hórus será o seu nome, e terá por coroa o Sol dos Céus!
Será belo e terá corpo de homem e cabeça de falcão.
Derrotará o traidor Seth, e governará o Egipto com ceptro e sábia mão.
Ele será a luz destes reinos, e da sua árvore nascerão os faraós!

Assim me falou Geb, teu Pai! Cumpra-se o que fica dito!
Que Seth seja anátema e pasto do eterno fogo
e que regresse Osíris, teu adorado esposo
que de novo ensinará o bom povo do Egipto
a pescar, a plantar a vinha e a semear o trigo.»

«Oh, estimado esposo, terno amante!
Imensa é a saudade dos teus olhos e dos teus beijos!
Perpétua é a minha sede da tua virilidade e da fúria da tua língua!
Vem a mim, amor meu, e cumpre os meus desejos!
Satisfaz esta louca espera, que do quente consolo morre à míngua.

Vem, Rei Primeiro, deus bom da fertilidade e do Mundo do Além!
Eu, a tua amada Ísis, aguardo o teu regresso!
Porque, Amor meu, os deuses não morrem!

Oh, que saudades das mornas noites de Mênfis,
quando o luar do deserto destoucava os meus cabelos,
que afagavas até à alvorada das estrelas!
Na tua falta, sonho os nossos corpos nus, em êxtase eterno
e sinto as tuas mãos em terna errância sobre o veludo da minha pele,
em mil carícias, na busca conseguida da culminância.

Está escrito nas linhas do Céu que me amarás de novo
e que o meu feminino corpo se entregará e se fundirá no teu!
Oh, como foi grande a minha dor na tua procura!
Que se cumpra agora a vontade de nossos Pais!
Que o teu divino corpo reunido com ternura ressuscite destes bálsamos
e a ele se junte teu sacro falo,
que com tanto amor e desvelo moldei em escultura!

Assim seja!»

(texto inspirado na lenda “Ísis e Osíris”, de Plutarco)

(1) - Geb – deus egípcio da Terra, irmão e esposo de Nut, deusa do Céu e da Noite. São pais de Osíris e Ísis.
(2) – Após Seth, irmão de Osíris, ter lançado o seu corpo esquartejado ao Nilo, a desventurada Ísis procurou-o pacientemente pelas margens do Nilo e costas do agora Mediterrâneo, até Byblos, a actual Jebail do Líbano. Conseguiu reunir todos os bocados, à excepção do “phallus” que, segundo algumas fontes mitológicas, terá sido comido por um peixe.
(3) - Thoth era o 1º mês do Calendário Egípcio.
(4) - Ísis disfarçou-se de águia. Hórus, o filho, é representado com cabeça de falcão, razão por que também é denominado por deus-falcão.

6 Comments:

Blogger Menina Marota said...

"...Oh, que saudades das mornas noites de Mênfis
quando o luar do deserto destoucava os meus cabelos
que afagavas até à alvorada das estrelas!..."


Oh... o amor místico dos sonhos, que corre como um rio de águas transparentes e nos enleva...

Um abraço e boa semana :)

2:20 da manhã, agosto 07, 2007  
Blogger teresamaremar said...

Tão bonito! As palavras fluem.

Pelo que neste teu canto tenho lido, pelos temas abordados, vou pedir uma ajuda... caminhos para explorar o tema do feminino, antigas sacerdotizas, sociedades matriarcais, deusas, ninfas, musas e afins, a Terra-Mãe... que leituras sugeres?

Abraço

2:41 da manhã, agosto 07, 2007  
Blogger Zénite said...

Menina_Marota

Humildemente digo que também gosto muito deste excerto.

Obrigado pelas palavras.

Abraço e uma noite tranquila.

________

Teresamaremar

Oh, não te sei sugerir nada.

Amante da história humana e da mitologia, “rato” de bibliotecas públicas em tempos idos, com muitos apontamentos que se vão perdendo, levados pelo vento que sopra das esquinas do tempo único gerado por um estranho Cronos de quatro asas e seis olhos - versão egípcia - que devora os seus filhos mas é simultaneamente símbolo da razão e das paixões que orientam a conduta dos homens, procuro as “minhas” deusas, fadas, ninfas, sacerdotisas, heroínas (Afrodites, Atenas, Ceres, Circes, Helenas, Heras, Penélopes, Camilas, Guineveres, Morganas, Vivianes… ) – poderia acrescentar o “eterno feminino” mas não arrisco - ;) – pelos caminhos brumosos da Ilíada, da Odisseia, da Eneida, dos Lusíadas, das lendas Arturianas, e até pelas estradas do Decameron, de Bocaccio (estas simples mortais, mas belas como todas as referidas).



Sobre boas bibliotecas online, que por certo conhecerás, mas que acrescento para o caso de por aqui passar alguém que as não conheça:

Project Gutenberg
http://www.gutenberg.org/wiki/Main_Page

Biblioteca Nacional Digital
http://bnd.bn.pt/
E já agora, por autores:
http://purl.pt/index/geral/aut/PT/M.html

P.S.: Sobre “sociedades matriarcais”, encontrei este site:
http://www.matriarchy.info/
ah, e tenho outro auxiliar: a Grande Enc. Port. e Brasil. : )

Uma noite tranquila.

Um abraço e obrigado pelo comentário.

9:30 da tarde, agosto 07, 2007  
Blogger teresamaremar said...

OLá Zénite

obrigada pela resposta :)

Estou a abrir o último site que indicas.

Uma boa noite

1:16 da manhã, agosto 08, 2007  
Blogger chipichipi said...

Delicioso!
Fui embalada até outras paragens!
E não o fui apenas pelo som, mas também pelas palavras!
Bj

9:45 da tarde, agosto 16, 2007  
Blogger Zénite said...

Teresamaremar

Ainda bem que o site te foi útil.

Abraço

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Chipichipi


Folgo que assim seja.


Obrigado pelo comentário.

Bjs.

11:33 da tarde, agosto 18, 2007  

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