há um choro granítico, silencioso, que pende hialino das paredes húmidas.
lágrimas e rugas apenas.
na vertical do meio-dia, da nora os mouriscos gemidos. numa esperança de sol, êxtase são as lágrimas e os limos. companheiras as estilhas de luz que tombam rente aos salpicos de água na cintilação ocre dos alcatruzes. um colar de pranto e argila sob a figueira brava.
da noite, o manto e os pássaros. num retorno ao mel e ao verde quase azul, o cabelo de vénus refulge de doçura sob o agosto de um quarto de lua.
do dia, a ignescência do sol e a quietude do vento em sonhos de água de brilho intenso.
fotossíntese das minhas utopias, dás-me a beber, serena capilária, na respiração solitária do teu silêncio, da esperança a doce clorofila.
na vertigem de espelhos do teu poço-oásis habitas-me assim, cappillus veneris, em inconsciente e etéreo delírio, as raízes mais profundas da minha alma.
[1]- Cabelo de Vénus. "Adiantum cappillus-Veneris" (Lin.) - Planta herbácia medicinal, também chamada capilária e avenca, que cresce nos sítios sombrios e húmidos do País (v.g. poços, minas, rochedos húmidos).
"...tirando a cada momento da algibeira rebuçados de avenca para o catarro" (Eça de Queirós, "O Primo Basílio)
eu choro o homem que morreu no ventre da terra-mãe em busca do vil metal, seja ele o ferro, o ouro ou o carvão, e que não teve tempo de ver crescer os filhos nem conhecer a fluidez do colorido quente do verão ou os magoados tons de violeta e sépia de que se veste o ameno e lânguido outono.
Pretendo com este “post” prestar uma humilde homenagem aos que, debaixo da terra, extraem o vil metal que comanda a vida dos que estão à superfície, tantas vezes a troco da própria vida (dos mineiros).
Dedico-o, por extensão, aos cerca de dois milhões de homens e mulheres – e crianças! – que, segundo a OIT, morrem anualmente em todo o Globo, vítimas de acidentes de trabalho e de doenças profissionais.
Só alguns exemplos (refererirei, para simplificar, somente os mineiros chineses, por serem os mais atingidos, e também por a ideia de este "post" ter surgido após o recente acidente verificado numa mina da China Central, como refiro no final deste escrito).
No primeiro semestre de 2007, cerca de 1800 trabalhadores morreram em acidentes ocorridos em minas chinesas, de acordo com uma estatística publicada pela imprensa estatal.
Fonte: Rádio Renascença, Portugal
De referir que nos anos de 2004, 2005 e 2006 as mortes nas minas chinesas atingiram, segundo fontes governamentais um total de cerca de 14 000 mineiros.
(fontes consultadas: RTP, Lusa e Folha Online)
No entanto, e de acordo com estatísticas não governamentais, aquele número ultrapassará 27 000 mortos.
P.S.: entretanto, uma boa notícia: foram resgatados com vida os 69 trabalhadores recentemente enclausurados durante 3 dias na mina de carvão de Zhijian, na província central de Henan, China, devido a fortes inundações de água.
Edvard Grieg - 'Peer Gynt', Op. 23: no 13, Act 4 Prelude – 'Morning'
Contou-nos tempos templos e distâncias Na deslumbrante transparência dos regressos Falou-nos dos palácios e da sabedoria dos gregos Cantou-nos deuses mitos e poetas E marejou sob as velas dos portugueses No oiro límpido de todos os poemas
Ensinou-nos a escutar o vento O impulso cadenciado das ondas O rumorejo cristalino das fontes E a admirar o fulgor dos espelhos de água Que incendeiam de brilhos as ilhas esmeraldinas
Exortou-nos a amar a lua e as estrelas E o encanto nocturno do seu silêncio E a apreciar a claridade e a nudez do dia Nos reflexos de sol dos horizontes Onde a paz se funde com a harmonia
Ensinou-nos a comungar a terra e as flores E o balançar ritmado do feno e das espigas A haurir o perfume dos pinhais e da maresia A admirar o voo e o cântico das aves E a maravilha das sombras e das cores Onde a terra-mãe fala com as árvores
Falou-nos da paz que imana do amor e da verdade E levou-nos às auroras onde mora o sol E ao esplendor da justiça e da liberdade Onde brotam as rosas do tempo inicial
Completaram-se no dia 2 de Julho p.p. três anos sobre a data em que a nossa saudosa Sophia nos deixou. Escrevi estes humildes "versinhos", há 3 anos, como singelo preito de gratidão e homenagem à grande Poeta.
caminharei sempre por estas veredas entre a pedra dura e o verde mar e beberei das fontes destes ventos a espuma das manhãs da preia-mar. modelarei com os meus dedos de argila a liquidez do fio do horizonte onde a linha de luz por que me guio voa à deriva com as andorinhas ao lado da gaivota de dorso cinzento.
contornando brumas e escolhos emigrarei silencioso e invisível ao teu encontro vogando nos espelhos de lua-de-água dos teus olhos.
mergulharei no mar vermelho dos teus lábios e subirei às nuvens brancas e hialinas na linha limite entre o céu e o mar onde as minhas lágrimas são salinas.
conheço as folhas deste livro. estive no seu lançamento. desfolhei na maresia este ar salgado esta doce brisa evanescente que paira nos horizontes azuis do tempo a pedra abismo para onde emigro.
na pátina submersa da voragem dos dias quando arrastadas pelo vento as folhas do calendário da terra rastejam setembrinas pelo chão ainda morno das ténues arestas de agosto setembro-me com elas sobre a pedra indócil. num prenúncio de chuva e vinho mosto madrugarei pelas teias de luz na tua procura e sob os céus de cobre de todos os ocasos anoitecerei igual como se fora equinócio.